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segunda-feira, 19 de julho de 2010

Nascimento da Isis, renascimento meu!

Em primeiro lugar, gostaria de destacar que qualquer glamour que possa aparecer nesse relato é posterior a ele. Estar em trabalho de parto me fez sentir muito mulher, na essência da palavra. Fêmea mesmo.




Dia 16 de junho de 2010. 40 semanas e dois dias de gestação e muita ansiedade. Acordei com uma forte dor no estômago, náuseas e vomitando muito. Quis lembrar o que teria comido pra me fazer tão mal assim, mas nada de diferente havia na minha rotina do dia anterior. Vomitei muito, absolutamente tudo que havia no meu estômago. Além disso, eu percebi que tinha um sangramento semelhante ao de uma menstruação. Meu marido ficou um tanto assustado e resolveu ligar para o meu obstetra, que falou: pode ser o corpo dela “limpando”, se preparando.



Foi-nos sugerido procurar a emergência do hospital para diminuir o mal estar. E fomos, porque eu sentia muita dor no estômago e absolutamente nada parava dentro dele. Meu obstetra foi até lá, me examinou e verificou: nenhuma dilatação, o que eu estava sentindo poderia até ser um trabalho de parto latente, mas, segundo ele, os sintomas poderiam cessar e minha filha nascer dali a uma semana, por exemplo. Ou poderia ser dali a algumas horas...



Depois de receber hidratação venosa, algo que aliviasse a dor no estômago e um protetor gástrico, fui liberada para ir pra casa. Chegando em casa, comecei a sentir dores abdominais e pensei : “hum, acho que agora começou”. Fiquei numa espécie de topor, tentando adormecer, mas sentindo contrações que ora ficavam próximas, ora mais espaçadas. Eram suportáveis, mas incomodas. Não sei a que horas exatamente cheguei em casa, mas já passava das 14 horas. Não conseguia me alimentar, então o jeito que meu corpo encontrou para poupar energia para o parto foi ficar letárgico, trazer-me um sono incomum. Aproveitei e dormi o quanto pude entre uma e outra contração.



Chegou a noite e meu marido, que o tempo todo esteve junto, tentando dar assistência, começou a ficar angustiado por eu não conseguir me alimentar. Tentei gelatina, água de coco, papinhas industrializadas para bebês, mas nada parava no estômago. Resolvi parar de brigar com a natureza e desisti de me alimentar. Meu marido decidiu entrar em contato com o meu obstetra, mesmo eu dizendo a ele que não precisava, que ainda não estava na hora. Pois bem, mesmo assim ele ligou e o médico pediu que fôssemos até o consultório. Mesmo com dores, frio e debaixo de chuva eu aceitei ir, queria saber a quantas andava o processo.



Chegamos no consultório por volta das 19 horas. Depois de ser examinada, fiquei bastante decepcionada com o que ouvi do médico: apesar do útero estar “amolecido”, bebê mais baixo, eu não estava nem com 1 centímetro de dilatação ainda. O trabalho de parto poderia demorar horas, avisou o médico. Sai de lá decidida a só ir ao hospital na manhã seguinte.



Voltando pra casa, as contrações – e as dores – se tornaram mais intensas, embora eu ainda conseguisse um pouco de serenidade entre uma contração e outra. Minha mãe chegou, trazida pelo meu irmão e minha cunhada; minha sobrinha de dois aninhos veio junto e até consegui dar um beijinho nela no intervalo das contrações.



Eu queria muito a presença de uma doula em meu trabalho de parto, mas precisei me arranjar comigo mesma. Meu lugar preferido durante as contrações era a cadeira de balanço, ou uma caminhada pelo corredor de casa. Luzes apagadas, claro. Eu nem sabia, mas já estava em trabalho de parto ativo.



As 22 horas meu marido e minha mãe sugeriram que eu aceitasse ir ao hospital. Eu, a princípio, relutei. Não queria. Mas as dores estavam intensas, contrações próximas (cerca de 2 a 3 minutos de intervalo) e estavam bastante regulares. Aceitei, decidi que iríamos sim. Capítulo a parte foi esperar o táxi: dia de chuva, àquela hora, demorou cerca de 40 a 50 minutos pra chegar. Durante as contrações eu gritava e reclamava da vida, mas dentro do táxi me comportei "muito bem", para não assustar o taxista; apenas apertava a mão da minha mãe e tentava não brigar com a contração, algo que me parecia impossível. Eu simplesmente esqueci que precisava respirar durante a contração. Como me fez falta uma doula!



Ao chegar no hospital, música para os meu ouvidos: o médico plantonista disse que eu estava com 7 centímetros de dilatação! Ah, que maravilha! Trabalho de parto ativo, tudo indo muito bem, obrigada! E ainda com alguma consciência entre as contrações! O médico plantonista pediu que entrasse em contato com o “meu” médico, mas ele já estava à caminho. Eu mesma pedi ao médico plantonista que avisasse à equipe do PPP do hospital que se preparasse, meu parto seria lá. Assim foi feito.



Minutos depois chegou meu obstetra. Eu estava com muito medo da intensidade das dores ficar maior, afinal a bolsa ainda não havia rompido e eu receei que a situação fugisse do meu controle (lúcido). Pedi analgesia. Eu tentei não brigar com as contrações, tentei respirar, tentei levar numa boa, mas não deu, não consegui. Infelizmente não havia fisioterapeuta no plantão, não consegui nem entrar na banheira e nem no chuveiro durante as contrações, nem vi a bola, nada.



Fui ao centro obstétrico do hospital para receber analgesia. O processo foi relativamente demorado, cerca de 40 a 50 minutos, afinal as contrações estavam bem próximas. Eu, no meu íntimo, clamava para que a analgesia funcionasse bem para poder conseguir dar conta do restante do processo. Como mágica, depois dos minutos todos que esperei, a dor deu lugar apenas às contrações. Ufa! Bem, como eu estava desidratada precisei receber soro. Tive receio que isso me limitasse para o restante do trabalho de parto, mas felizmente não atrapalhou. Ao final da analgesia, observei um relógio que havia na parede: meia noite. “Isis não nascerá mais no dia 16 de junho”, falei. Novo exame antes de sair do centro obstétrico: 8 centímetros! A bolsa rompeu e foi bom sentir aquele líquido quente escorrendo! Felizmente eu já havia recebido analgesia, assim o medo não atrapalhou o andamento do restante do trabalho.



De volta ao PPP, minha mãe e meu marido ficaram comigo o tempo todo a partir daí. Ah, achei a bola! Lembrei que alguns movimentos na bola poderiam ajudar a dilatar o restante que faltava. Fiquei na bola durante todo o restante do TP. Não havia mais dor, mas eu sentia nitidamente as contrações. É bem verdade que elas ficaram um pouco mais fracas depois da analgesia, mas eu ainda podia senti-las. Depois de um tempo comecei a sentir um “peso” no canal vaginal. Falei pro médico, que sugeriu que avaliássemos.



Ok, 10 centímetros, dilatação total! Mesmo sob efeito da analgesia, dilatei 2 centímetros em cerca de 1 hora, um pouco mais ou um pouco menos. No PPP do hospital existe uma cama que proporciona a posição semi-vertical e foi assim que fiquei nos próximos minutos. A posição era bastante confortável. Como as contrações ficaram menos intensas, acabei por receber 1 ampola de ocitocina (a contragosto, mas foi a a primeira parcela do preço que paguei pela analgesia). Não senti dor, mas as contrações ficaram um pouco mais fortes.



A partir daí, entrei na “partolândia”, não me lembro muito bem do que aconteceu. Eu sentia vontade de gritar toda vez que sentia uma contração. Sentia vontade de fazer força quando elas vinham. Não consigo lembrar do que acontecia fora de mim naquele momento. Toda minha memória dessa ocasião parece estar em câmera lenta, ou como se fossem fotografias, em flash. Lembro apenas do médico dizendo que eu estava indo bem, que Isis estava chegando. Aí veio a segunda prestação do preço que paguei pela analgesia: epsiotomia! Eu não sabia muito bem pra onde direcionar a força. Faltando duas contrações pra Isis chegar, ganhei a epsio, mesmo me esforçando muito para que ela não fosse “necessária”. Diante das circunstâncias, aceitei e deixei o resto do processo acontecer.



Mais uma contração e ela coroou. Ah, o círculo de fogo! Senti, e como senti! Não houve analgesia do mundo que me tirasse a possibilidade de sentir aquela sensação tão intensa. Outra contração e senti passar a cabeça, em seguida os ombros. Depois o corpinho. Que coisa boa sentir o corpo dela passar!



De repente olho em volta, atônita e me dei conta: nasceu, ela nasceu! Meu marido chorava! Que sensação louca! Ela veio pros meus braços do jeitinho que nasceu, ficou durante alguns minutos. Conversei com ela, senti seu cheiro. Depois levaram ela para os cuidados neonatais (fui muito mole em meu plano de parto com relação a isso, minha filha sofreu muitas intervenções). Eu perguntei, claro: “quando ela vai mamar?” “Daqui a pouco”. Depois de cerca de 30 minutos ela voltou para meus braços e pode, enfim, mamar e receber meu calor.



Minha pequena nasceu a 1h56min do dia 17 de junho de 2010, 40 semanas e 3 dias de gestação, com 3kg165g, 49 centímetros, apgar 9/10 e capurro de 40 semanas. Muito saudável e perfeita. Num parto que foi uma grande vitória. Que também foi perfeito para a Anne que existia até então. Que existia. Agora sou outra pessoa. As mudanças que experimentamos depois de parir, os cuidados com nosso bebê, o reaprender a viver, definitivamente, nos transformam em outra pessoa. Isis nasceu. Eu renasci.